domingo, 6 de setembro de 2015

Quando me vi negra!





Lembro-me com clareza quando a irmã de uma amiga minha, em uma de nossas conversas de ideologia, me relatou em tom de lamentação e revolta sobre o racismo que ela enfrentava na nossa cidade (Lê-se Salvador, onde a população em sua maioria é negra).
Lembro-me também que rebati o discurso dela dizendo que não via as coisas naquela dimensão e que racismo ia muito mais da forma que a gente enfrentava tudo aquilo. Eu estava enganada.
Em dezembro de 2013 decidi parar com a química (nos cabelos). Essa decisão veio após muitas tentativas frustradas, incontáveis tentativas frustradas. Eu ouvia coisas abomináveis quando anunciava que ia parar com a química, mas os meus ouvidos acostumados com discursos racistas implantados, jamais notou a gravidade de cada frase dita a mim, naquela época.
Depois que resolvi enfim assumir meu cabelo, fui percebendo com o passar do tempo, que eu não estava somente assumindo a minha raiz crespa, mas uma história pesada de ser sentinda e que eu iria sentir na pele, literalmente.
Quando eu usava os cabelos alisados, não tinha olhos atentos a essa dimensão de rebate a cor negra. E após ter assumido meu cabelo crespo e ter de enfrentar diariamente racismo explícito e velado, me perguntei: "Então é isso? Então é isso que é ser negro? Eu sou negra então?"
E me vi ali, apesar de assustada, acolhida pela minha identidade negada. E me perguntei mais: " Será que é por isso então, que muit@s menin@s, sofrem oprimid@s e pres@s a química por medo de tudo que podem enfrentar socialmente, caso se assumam? " - E fiquei inquieta. Como estou e prossigo até hoje. Essas pessoas precisam de libertação. Não digo com isso que não possam alisar seus cabelos, que não possam mudar a estrutura do seu fio, mas desde que esteja claro, que o caminho do alisamento inicialmente é um caminho do embranquecimento, da desvalorização e do desrespeito a nossa beleza natural.
O racismo existe, e isso jamais findará. Eu não acredito no fim do racismo. Porque o ser humano é em sua maioria pequeno, medíocre e está preso a coisas tão pequenas e banais, como cor de pele, estatura física, condição sexual, posição social, que se esquecem do que é essencial, da riqueza que cada um carrega por dentro. Jamais vou entender e conseguir acompanhar o pensamento de um racista, e também não quero.
Mas ser negra para mim é uma honra. Hoje me sinto forte. Me sinto amada. Me sinto vista. E por mais que meu estômago embrulhe cada vez que ouço abominações racistas (consciente ou inconscientemente), eu não trocaria a minha identidade por nada nesse mundo. Não trocaria o meu cabelo crespo por nada nesse mundo. Se ser negro é ter que enfrentar tudo isso, não estou pronta, ninguém está pronto para lidar diariamente com a violência, mas estou aqui, estou firme e assim seguirei, porque negro é fortaleza, sempre foi.


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