sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Angustiante!

Hoje 16/12/2011, sexta-feira, por volta das 17:20 da tarde, ao sair do estágio no bairro do Canela me deparei com uma cena não muito comum no meu dia a dia, e realmente pretendo que não mais seja. Na Reitoria da UFBA um amontoado de pessoas curiosas, preocupadas talvez e porque não dizer desocupadas e sedentas de notícias da vida alheia ocupavam o mesmo espaço me deixando na mesma situação que elas: curiosa, preocupada talvez, desocupada e porque não sedenta da notícia oriunda da vida alheia. 
A cena era a seguinte, no meio daquela roda de curiosos, estava desacordado um senhor que aparentava uma idade entre 50 e 60 anos, supostamente vítima de um infarto, provavelmente vindo do interior do estado para fazer tratamento no Hospital das Clínicas, pois ao seu lado havia uma mala e uma mochila (Impressões minhas). Jovens provavelmente estudantes da UFBA e supostamente ocupantes do saber médico ou da mínima noção de primeiros socorros tentavam reanimá-lo. Uma das jovens estudante se demonstrava detentora e segura do que estava fazendo, iniciando no jovem senhor uma massagem cardíaca esperando por uma reanimação, fazendo assim o reversamento com uma colega. O outro estudante tentava pedir aos curiosos que dessem espaço para o trabalho  daquelas jovens. A quantidade de pessoas ao redor aumentava, algumas possuíam a aparência de descaso, outras de desespero e outras apenas se preocupavam em registrar aquela situação via celular (viva a modernidade). Algumas outras entravam em contato com o SAMU ( Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e pelo que pude ouvir já haviam feito o contado havia se passado 20 minutos. A tentativa de reanimação permanecia, mais uma jovem estudante se aproximou na tentativa de ajudar, e a massagem cardíaca seguia no intuito de trazer aquele senhor a vida ou prorrogar algo que naquelas circunstancia se tornava ainda mais difícil.

Alguns dos curiosos permaneciam entrando em contato com o SAMU que ao questionarem a demora do serviço tiveram como resposta a derrubamento da ligação. Após uma demora de 20 minutos relatados pelo pessoal ali presente e mais 10 minutos eu ali presente observando aquela situação o carro do SAMU chegou para demonstrar prestação de serviço a sociedade, sociedade essa que   se porta com total descredito aos Serviços de Saúde Pública e com toda razão. Já não se fazia mais necessária a presença do serviço da SAMU ali naquele local, o que para ser feito, foi de fato feito pelos estudantes, pelos curiosos, mas não pelo serviço que deveria está a disposição da sociedade. 
Não querendo acreditar no que estava explícito, me aproximei um pouco mais, a aparência daquele jovem senhor havia mudado por questão de minutos e ele veio a óbito, falecimento também na face da jovem que lutou pela vida do próximo e na sua fala ao comunicar aos colegas que era seu primeiro óbito (ela utilizou termos técnicos no momento), falecimento e desapontamento na face dos dois colegas que estavam ali o tempo inteiro ajudando a. Eu quis aparentar tranquilidade, e porque não dizer que quis aparentar frieza diante daquele caso, mas o passar da mão pela minha cabeça por diversas vezes, o enrugar da testa, o cair dos lábios, o acelerar do coração e a contração do estômago denunciavam o meu desapontamento e angústia.

Naquele momento, frente àquela situação eu questionava a demora do serviço que deveria ser um serviço de urgência, questionava o descaso dos profissionais da SAMU diante daquele quadro de desleixo social, político e ético ao chegar no local, questionava a minha posição quanto profissional de saúde e cidadã brasileira também vítima do estado precário que nos mata aos poucos e a cada dia. Esse é o Serviço de Saúde Brasileira.
O meu ônibus enfim chegou, me despedi daquela cena com uma postura firme e camuflada, o coração permanecia acelerado,  o nó na garganta não afrouxava e a cabeça não parava de maquinar idéias carregadas de revoltas e até um certo exagero. Sentei no banco do ônibus e meu desejo era compartilhar a minha angústia com alguém, queria que alguém me perguntasse o que houve para que eu pudesse desabafar aquele desapontamento. No meio do caminho me percebi colocando barreiras nas lágrimas que brotavam, e me questionava se tinha esse direito de chorar por alguém que morreu e eu nem se quer sabia da sua história. Será que eu tinha o direito de chorar por alguém que eu não tinha nada em comum? 
Sim, eu tinha esse direito! Tinha o direito de me angustiar frente a omissão de socorro do SAMU, pois é assim que eu considero a demora para um serviço de emergência que deveria receber uma maior atenção e importância, mas o que vemos é o total despreparo dos profissionais (não agravando a todos) que compõe o quadro de equipe técnica desse serviço. Tinha o direito de deixar rolar as lágrimas, pela lástima da perda de uma vida, de um familiar, de um pai, marido, filho, seja lá de quem ele fosse. Foi. Foi-se mais um cidadão brasileiro, vitima da demora de atendimento, vítima da precarização da política brasileira, vítima do descaso por ser pobre e excluído socialmente (conclusões minhas). E é ai que me aproximo desse jovem senhor.


Ainda angustiada, fico por aqui!

Um comentário:

  1. MUITO BOM! MUITO BOM! Cheguei me arrepiar Sah! Emocionante! Vc relatou de uma forma que pude estar presença na cena do ocorrido! é angustiante e triste a situação do nosso país, principalmente da nossa cidade! Que esse Senhor vá em paz!

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